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01/08/2017 (15H11)

Justiça obriga governo de
SP a repor policiais civis

Em pelo menos 10 cidades paulistas já existem decisões favoráveis ao aumento do
efetivo policial. Ação proposta pelo Ministério Público de Descalvado também tenta
aumentar o número de policiais, e melhorar as condições da Delegacia de Polícia da cidade.

  


U
ma determinação que a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) criou em 2013 e que ela mesmo revogou no ano passado tem causado uma série de questionamentos e brigas judiciais entre o governo do Estado e os municípios paulistas. Há quatro anos, a gestão estabeleceu um número ideal de policiais para cada delegacia, mas sem conseguir cumprir a demanda, voltou atrás em abril de 2016. Agora, decisões na Justiça têm obrigado o governo estadual a cobrir o deficit de delegados, investigadores, escrivães e agentes nas delegacias paulistas.

A primeira decisão de mérito nas ações ajuizadas pelo Ministério Público por todo o Estado saiu em maio. No entendimento da juíza Juliana Maria Finatti, a segurança é um direito constitucional do cidadão e obrigação do Estado. Coube a ela determinar que o governo estadual adotasse medidas cabíveis para garantir à Delegacia de Polícia de Águas de Lindóia, município de 18,4 mil habitantes na região de Campinas, o mínimo de 22 policiais.

"Certo é que a resolução foi revogada. No entanto, a obrigação do Estado não advém apenas de um ato normativo, mas da Constituição Federal, que instituiu a segurança pública como um direito fundamental do cidadão", afirmou a juíza na sentença.

No despacho, Juliana rebateu os argumentos do Estado, que tinha afirmado que o pedido de reforço de policiais feito pelo Ministério Público feria o princípio constitucional da divisão dos poderes.

Para o Estado, a demanda é ilegal, pois interfere no poder discricionário do Executivo, além de atingir os princípios da igualdade e equidade, não sendo possível planejar nomeações, afastamentos e aposentadorias.

"Nem se diga que haja ingerência indevida do Judiciário em assunto exclusivo do Poder Executivo, pois isso não se dá neste caso, onde se determina a implementação de políticas públicas para assegurar direitos fundamentais do cidadão, como a segurança", afirmou a juíza.

Pela decisão, o governo do Estado tem de reservar para Águas de Lindóia, nas próximas nomeações, um delegado, sete investigadores, cinco escrivães, quatro agentes, um auxiliar e três carcereiros,


O secretário de Estado da Segurança
Pública, Mágino Alves Barbosa Filho

sob pena de multa diária de R$ 1.000. O Estado pode recorrer da decisão.

Atualmente, a unidade conta apenas com cinco policiais, sendo um delegado, um investigador, dois escrivães e um agente. Nos últimos seis meses, os furtos na cidade cresceram 60,7% - para 90 casos - em relação ao mesmo período do ano passado.

"A investigação está parada. Nós temos quase 200 inquéritos aqui em andamento. Não tem como fazer um trabalho de qualidade", disse o delegado Oswaldo Faria Júnior, que observou que os principais desafios no município são combater os furtos e o tráfico de drogas.

Faria Júnior afirmou que nas atuais condições, busca priorizar o registro de ocorrências e o atendimento ao público. "Aqui eu só tenho um investigador. Não dá para ele ir sozinho para a rua. Por isso a gente só faz uma apuração inicial e pede ajuda da Seccional para mandados de busca, por exemplo."

De acordo com o delegado, o último servidor estadual chegou na delegacia em 2012. De lá para cá, não houve nenhuma notícia de reposição. A delegacia conta ainda com dois servidores cedidos pela prefeitura para auxiliar nos trabalhos administrativos.

DESCALVADO - No final de 2016, a Promotora de Justiça de Descalvado, Dra. Mariana Fittipaldi, ingressou com uma Ação Civil Pública contra a Fazenda Pública do Estado de São Paulo, para a garantia da segurança pública em razão do número insuficiente de servidores lotados na Delegacia de Polícia do município.

Na época em que o Ministério Público propôs a ação, além de não contar com um delegado titular, a cidade contava com quatro escrivães de polícia, e apenas três investigadores e um agente policial, número insuficiente para dar conta dos 230 inquéritos policiais em andamento e de 53 termos circunstanciados. Além disso, dos profissionais lotados na Delegacia de Descalvado, três policiais civis já possuem os requisitos para aposentadoria, sendo certo que, a qualquer momento, deixarão de fazer parte do efetivo.

Na mesma ação, o MP também denunciou as condições precárias em que se encontram algumas viaturas utilizadas pelas equipes da Polícia Civil, bem como as más condições de conservação do prédio que abriga o órgão de polícia, inclusive com notícias de que alguns procedimentos investigatórios poderiam ter sido danificados em razão de infiltrações no prédio.

A Promotora de Justiça também relatou que em razão do baixo número de policiais civis, pode haver uma deficiência nas investigações criminais, implicando o não esclarecimento da materialidade e da autoria das infrações penais e, consequentemente, a impunidade, que, por conseguinte, em um ciclo vicioso que se perde ao infinito horizonte, estimulando a violência e a criminalidade.

O MP também diz na ação, que a Delegacia de Polícia de Descalvado (classificada como de 2ª classe) deveria contar com pelo menos dois Delegados de Polícia, cinco escrivães, sete investigadores, dois agentes de telecomunicações, um auxiliar de papiloscopista, três carcereiros e dois agentes policiais. Fittipaldi porém reconheceu que diante da necessidade que o Estado têm de atender as demandas existentes em outros municípios paulistas, considera serem suficientes para garantir "um mínino de dignidade à Delegacia de Polícia de Descalvado", um Delegado de Polícia titular, cinco investigadores, cinco escrivães de polícia, um agente de telecomunicações e dois agentes policiais.

   

 

Em sua defesa, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) reconheceu que assim como acontece em outros municípios paulistas, a Delegacia de Polícia de Descalvado também carece de melhorias. Apontou também que desde o mês de abril, a cidade já conta com um novo Delegado de Polícia - o Dr. Alexandre da Silva Leonardo. Ainda em sua defesa, a PGE atentou para o fato de que, em nenhum momento a Polícia Civil deixou de prestar os serviços relativos à sua esfera de atribuições, ou seja, o exercício do direito à segurança pública da população de Descalvado está mantido e não foi suspenso em razão da falta de servidores. "Certamente o ideal seria termos todas as unidades com seus quadros preenchidos e até, em sendo o caso, aumentados; porém, entre a ideação e a realidade há uma distância que deve ser conhecida e sopesada pelo Administrador Público, que o faz elegendo prioridades e, sobretudo, atendo-se às normas legais quedisciplinam a matéria", relatou o documento.

A decisão agora está a cargo do Dr. Rodrigo Octavio Tristão de Almeida, juíz da 2ª Vara da Comarca de Descalvado.

Cidades maiores - No final de junho, o juiz Wander Pereira Rossette Júnior, da Vara da Fazenda Pública de Piracicaba, no interior paulista, determinou que o governo do Estado providencie, em um prazo máximo de seis meses, a nomeação e lotação de 110 policiais para as delegacias da cidade e de outros dois municípios da região, além do IC (Instituto de Criminalística) e a da Polícia Científica.

A decisão liminar foi obtida pelo Ministério Público, que investigou o deficit de servidores. Piracicaba tem quase 400 mil habitantes, de acordo com estimativas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).


Juíz de Piracicaba determinou que o Estado providencie a nomeação de 110 policiais civis para delegacias da cidade e outros municípios da região.

"Os transtornos sofridos pela população se dão basicamente pelo descaso das autoridades responsáveis pelo funcionamento da segurança pública no Estado, bem como pela gestão equivocada e nefasta desenvolvida pelo governo estadual, gerando a debilidade do serviço essencial", afirmou o juiz na decisão liminar.

Responsável pela ação, o promotor do Patrimônio Público e Social de Piracicaba, João Carlos de Azevedo Camargo, afirmou que a revogação da resolução pelo próprio Estado "demonstra o desinteresse em solucionar, de forma definitiva, o problema crônico de falta de policiais civis."

OUTROS CASOS - Leme foi um dos primeiros municípios a registrar decisão da Justiça obrigando o governo a repor os policiais em falta. A liminar foi dada em abril do ano passado. O governo recorreu, mas a Justiça manteve a decisão. Segundo a Promotoria, a cidade tinha 31 policiais, quando o necessário seria ao menos 49 funcionários.

Também no ano passado, a Justiça concedeu liminar na ação ajuizada pelo Ministério Público em Jales, determinando que o Estado apresentasse em 60 dias um cronograma de providências para garantir à Polícia Civil da cidade e da região o número mínimo de policiais. O Estado recorreu e a liminar foi suspensa. Agora, a decisão de mérito está pronta para ser dada.

Segundo a Promotoria, faltam ao menos 32 delegados na comarca, sendo que oito deles estão às vésperas de se aposentarem. Além disso, cinco dos sete municípios da comarca não contam com delegado titular. Para o Ministério Público, "a deficiência da investigação criminal implica em impunidade, que, por conseguinte, estimula a criminalidade".

Também foram ajuizadas ações em São José do Rio Preto, Dracena, Ilha Solteira, Itapura, Lindóia e Jacareí. Em nenhum dos casos há informações de que o efetivo recebeu reforço ou que foi cumprida integralmente a decisão.

Deficit - Segundo levantamento do Sindpesp (Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo), o Estado de São Paulo tem um deficit de 560 delegados e cerca de 10 mil policiais civis, entre investigadores, escrivães, agentes e carcereiros. Ainda de acordo com o sindicato, 256 dos 645 municípios paulistas não têm delegado de polícia.

"A conta nunca fecha. O Estado não acompanhou o crescimento da população desde os anos 1990. Pelo contrário, houve enxugamento. E das nomeações feitas a partir do último concurso público, em 2013, não preencheu sequer os cargos vagos em razão de aposentadorias ou exonerações", disse a presidente do sindicato, a delegada de polícia Raquel Kobashi Gallinati.

Segundo ela, o trabalho da Polícia Civil no Estado é "limitado". Além da falta de profissionais, a estrutura é precária e há cinco anos o governo não paga a reposição inflacionária. "O governo paulista não trata bem o policial civil. Apesar de ser o Estado mais rico do país, é o que pior remunera o policial", afirmou Raquel.
 



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