O DIREITO À PRIVACIDADE
NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO |
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Por
Dra. Vanisse R. Gonçalves
OAB/SP 200.525 |
As relações decorrentes da vida em sociedade ensejam
vários conflitos que precisam ser compostos para o
equilíbrio da paz social agindo o Estado como
moderador na resolução destes entreveros.
Dentre estes conflitos, destacamos a liberdade de
informação e o direito à privacidade, pois, com a
evolução da sociedade e dos meios de comunicação de
massa, como jornais, rádio, TV e internet, as pessoas
são expostas cada vez mais facilmente.
O poder da informação é enorme e se expande muito
rapidamente. Fotografias, palavras e textos virtuais,
podem alterar significativamente a vida de uma pessoa,
distorcendo pontos de vistas e opiniões, produzindo uma
imagem positiva ou negativa quanto a pessoas físicas e
até mesmo jurídicas.
Na tentativa de conter o uso indiscriminado e
criminoso de informações pessoais, entrou em vigor no
dia 02/04/2013 a Lei 12.737/12, conhecida como “Lei
Carolina Dieckmann”, que tipifica os crimes cometidos
por meio da internet.
Em 2012, a atriz sofreu com a divulgação de fotos
pessoais decorrentes da invasão de seu computador
pessoal e, até então, não tínhamos no ordenamento
jurídico uma legislação específica sobre o assunto.
Recentemente, acompanhamos ainda o caso do também ator
Murilo Rosa, revelando que tais situações vêm se
tornando corriqueiras.
A lei tipifica ainda o uso de dados de cartões de
crédito ou débito obtidos de forma indevida ou sem
autorização, equiparando a prática ao crime de
falsificação de documento particular. Prevê ainda o
crime de “invasão de dispositivo informático” com a
finalidade de obter, adulterar ou destruir dados,
penalizando, inclusive, aquele que oferece, distribui,
vende ou difunde programa de computador com o intuito de
permitir a invasão. Outro ponto refere-se à interrupção
de serviço telegráfico, telefônico, informático,
telemático ou de informação de utilidade pública.
Referida Lei trouxe significativo aporte ao Código
Penal, que agora passou a conter previsão expressa dos
crimes de violação cometidos em dispositivos
informatizados, cuidando desta questão no novo artigo
154-A, assim como especificou no artigo 154-B, o tipo de
ação penal que será deflagrada nessas situações:
Invasão de dispositivo informático:
Art. 154-A. Invadir dispositivo informático alheio,
conectado ou não à rede de computadores, mediante
violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim
de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem
autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo
ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem
ilícita:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e
multa.
§ 1o Na mesma pena incorre quem produz, oferece,
distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de
computador com o intuito de permitir a prática da
conduta definida no caput.
§ 2o Aumenta-se a pena de um sexto a um terço se da
invasão resulta prejuízo econômico.
§ 3o Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de
comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais
ou industriais, informações sigilosas, assim definidas
em lei, ou o controle remoto não autorizado do
dispositivo invadido:
Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e
multa, se a conduta não constitui crime mais grave.
§ 4o Na hipótese do § 3o, aumenta-se a pena de um a
dois terços se houver divulgação, comercialização ou
transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou
informações obtidos.
§ 5o Aumenta-se a pena de um terço à metade se o
crime for praticado contra:
I – Presidente da República, governadores e
prefeitos;
II – Presidente do Supremo Tribunal Federal;
III – Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado
Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara
Legislativa do Distrito Federal ou de Câmara Municipal;
ou
IV – dirigente máximo da administração direta e
indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito
Federal.
Ação penal
Art. 154-B. Nos crimes definidos no art. 154-A,
somente se procede mediante representação, salvo se o
crime é cometido contra a administração pública direta
ou indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados,
Distrito Federal ou Municípios ou contra empresas
concessionárias de serviços públicos.”
Além disso, a lei nº 12.737 alterou o conteúdo dos
artigos 266 e 298, ambos do Código Penal, de forma que o
primeiro passa agora a contar com dois parágrafos,
estando previsto no primeiro deles a previsão do crime
do caput ser praticado por meios informatizados. Já em
relação ao crime de falsificação previsto no artigo 298,
houve a criação de um parágrafo único onde equipara o
cartão de crédito a qualquer outro documento particular
suscetível de falsificação, de forma que, por exemplo, a
clonagem de cartão de crédito passa a contar com um tipo
penal específico:
Art. 266-Interromper ou
perturbar serviço telegráfico, radiotelegráfico ou
telefônico, impedir ou dificultar-lhe o
restabelecimento:
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
§ 1º Incorre na mesma pena quem
interrompe serviço telemático ou de informação de
utilidade pública, ou impede ou dificulta-lhe o
restabelecimento.
§ 2º Aplicam-se as penas em dobro se o crime é
cometido por ocasião de calamidade pública.
Falsificação de documento particular
Art. 298 - Falsificar, no todo ou em parte, documento
particular ou alterar documento particular verdadeiro:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.
Falsificação de Cartão
Parágrafo único. Para fins do disposto no caput,
equipara-se a documento particular o cartão de crédito
ou débito.
Contudo, em que pese a relevância das modificações
inseridas no Código Penal, importante lembrarmos que é
garantido aos brasileiros, pela Constituição Federal, o
direito à privacidade. O artigo 5.º, inciso X, assim
destaca: "são invioláveis a intimidade, a vida privada,
a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação".
Verifica-se que a intimidade é algo maior até mesmo
do que a vida privada. A intimidade caracteriza-se por
aquele espaço considerado pelo indivíduo como
impenetrável, intransponível e que diz respeito única e
exclusivamente à própria pessoa, como por exemplo, as
recordações pessoais, memórias, diários, etc... São os
segredos, as particularidades, as expectativas....
Já a vida privada consiste naquelas particularidades
que dizem respeito, por exemplo, às relações familiares
como lembranças, problemas, saúde física e mental,
etc... Seria, então, aquela esfera íntima de cada um,
que vedasse a intromissão alheia. Entretanto, percebe-se
que neste caso a pessoa poderia partilhá-la com as
pessoas que bem lhe conviesse, sendo da família ou
apenas um amigo próximo.
A idéia de honra traduz-se em “probidade, virtude e
bom nome”, valendo dizer que a honra é composta pelas
qualidades que caracterizam a dignidade da pessoa, o
respeito dos concidadãos, a reputação e a dignidade. A
proteção à honra consiste no direito de não ser
molestado, injuriado, ultrajado ou lesado na sua
dignidade ou consideração social.
Por imagem devemos entender não só o retrato, a
exteriorização da figura física, mas também o retrato
moral do indivíduo ou de uma empresa, ou seja, à
projeção de sua personalidade física ou moral face à
sociedade, incidindo, assim, em um conjunto de
caracteres que vão identificá-la no meio social.
A reserva do espaço privativo do cidadão é muito
valorada, a ponto de ser considerada direito fundamental
e inalienável. Tal previsão é importante em razão do
avanço de tecnologias que comumente são utilizadas para
invadir o espaço secreto das pessoas possibilitando uma
devassa na intimidade das mesmas, provocando muitas
vezes, dor, sofrimento e discórdia pela revelação de
certos dados e particularidades.
Não se pode, portanto, expor as pessoas a
constrangimentos ou de alguma maneira interferir, sem o
consentimento do indivíduo, em sua vida particular, sob
pena de sujeitar-se, além da penalização criminal, a
indenizações de ordem material e moral em razão de sua
conduta.
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