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A decisão de um juiz de execuções penais de libertar uma presa em estado
terminal para que pudesse passar os últimos dias de vida em casa, ao lado da
família, motivou o filho dela, um menino de 11 anos, a escrever uma mensagem ao
magistrado, enviada pela internet. O caso aconteceu em Joinville,
no norte de Santa Catarina.
Em dezembro do ano
passado, a sogra da mulher presa chegou de mãos dadas com o neto
ao gabinete do juiz João Marcos Buch para fazer um pedido: que a
mãe do menino, presa havia 6 anos por furto e então
hospitalizada, tivesse o direito de morrer em casa, "com
dignidade". |
O juiz decidiu ir até o hospital onde a presa estava internada com uma
lesão cerebral provocada pela toxoplasmose, adquirida em decorrência da
Aids.PARALISADA
E ALGEMADA -
“Embora estivesse com metade do corpo paralisado, ela estava algemada
pelo tornozelo. Compreendo que é um protocolo de segurança, mas não era
razoável”, contou o juiz. Ele decidiu, então, autorizar a prisão
domiciliar, o que foi feito assim que a presa recebeu alta.
No dia 25 de março, a
mulher morreu num hospital de Florianópolis, após passar os últimos dias
de vida na casa de uma irmã, ao lado dos filhos de 11 e 9 anos, que ela
não via fazia mais de um ano.
Sobre o tempo que
passaram juntos, a avó do menino que escreveu a carta conta que a
criança teve dedicação total à mãe. "Foram à praia, fizeram passeios.
Ele dormia num colchão ao lado do sofá só pra cuidar dela, caso ela
precisasse de alguma coisa. Deixou até de brincar para cuidar da mãe",
conta. A criança retornou a Joinville, e hoje vive com o irmão sob os
cuidados da avó paterna.
Com 20 anos de
magistratura, Buch se surpreendeu quando leu a mensagem enviada pelo
filho da presa, semanas depois. Na mensagem, o menino agradece pela
decisão de dar “dignidade” à morte da mãe, revela também ser
soropositivo e se mostra esperançoso com o futuro.
LEIA A ÍNTEGRA DA CARTA
- "Olá, senhor juiz. Minha avó disse que eu podia deixar um recado
aqui, que o senhor ia ver. Tenho 11 anos e sou filho da ... Sei que o
senhor vai lembrar, sou neto da... e só queria agradecer ao senhor.
Cresci vendo meus pais fazendo coisa errada e sendo presos. Por muitas
vezes entrei na prisão para visitar meu pai ou minha mãe. Por muitas
vezes vi eles ganharem a liberdade e novamente serem presos. Mas hoje
esse é um passado que não faz mais parte do meu presente. Quis Deus que
meu pai saísse da prisão em dezembro, de condicional e fosse trabalhar.
Minha mãe, quis Deus que ela ficasse bem doente e o senhor foi lá
soltar. Eu tava segurando a mão da minha vó quando ela foi na sua sala
pedir para aquelas moças que alguém fizesse alguma coisa pra minha mãe
morrer com dignidade e o senhor fez. Também sou soropositivo, essa
escolha não fui eu quem fez, mas tenho direito às próximas. E desde já
quero ser um homem honesto. Obrigado, senhor juiz João Marcos."
MENINO EM SILÊNCIO
- O juiz diz se lembrar de que, na ocasião da visita ao seu gabinete, o
menino permaneceu em silêncio, “não chamou muita atenção”. “Mas o caso
me sensibilizou. Não é razoável morrer no ambiente carcerário quando se
tem uma família do lado de fora”, explicou o juiz.
"Ela morreu com a
liberdade que ansiou, teve tempo de se arrepender", afirma a avó do
menino. "E meu neto sentiu que tinha que agradecer, por isso escreveu a
carta."
Buch diz que já havia
tomado decisões anteriores do mesmo tipo, mas sem a mesma repercussão.
Ele afirma que costuma receber pessoas em seu gabinete e mantém uma
página não pessoal em uma rede social, onde mantém contato com egressos
do sistema prisional e familiares. “Não posso aconselhar, mas é uma
maneira de humanizar a Justiça", afirma o juiz.
Na resposta à criança,
Buch escreveu, de maneira simples e bem longe do complexo vocabulário
jurídico: “Vc é um menino muito inteligente.”
*Fonte: G1/Santa
Catarina - Foto: Diorgenes Pardini
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