Família aponta burocracia e falta de médico como responsáveis pela morte de
motorista de 49 anos
Um clima de
revolta misturado com o sentimento de descaso tomou conta da
família de Angelo Aparecido Scabio, falecido na tarde deste
domingo (24) após dois dias lutando para receber atendimento e
ter o direito à internação no Pronto Socorro da Santa Casa de
Misericórdia de Descalvado.
Os familiares
do motorista de caminhão de 49 anos de idade estão revoltados
com a falta de atendimento e a ausência de um médico
plantonista, que desde sábado, viram-se envolvidos no meio de um
jogo de “empurra” protagonizado pela direção da Santa Casa e os
médicos que não dão plantão na entidade da cidade.
Segundo
informações, por ordem da Provedoria da Santa Casa de
Misericórdia, os médicos que não dão plantão na Santa Casa estão
impedidos de solicitar a internação de pacientes pelo Sistema
Único de Saúde – SUS. No caso específico do paciente Angelo
Scabio, a situação se agravou pela falta de plantonista no
local, que segundo a família, o profissional estaria em Porto
Ferreira enquanto deveria estar de plantão na Santa Casa.
De acordo com a nora de Angelo, Raquel Cristina Landgraf,
ele teria passado por uma pequena cirurgia na última
quarta-feira (20) para corrigir um problema na visão.
Segundo Raquel, Angelo também possui um histórico de saúde
que exigia alguns cuidados, agravados por um quadro de
diabete moderada e de pressão alta. Na tarde de sábado, o
sogro teria passado mal e os parentes procuraram o Dr. Jair
Antonio da Costa, médico da família ha mais de 30 anos. Após
o atendimento, o médico disse a família que seria necessária
a internação de Angelo na Santa Casa de Descalvado para
receber os cuidados e os tratamentos necessários.
Ao chegarem no Pronto Socorro,
o plantonista Dr. Eduardo Leite, examinou o paciente e disse
que não seria necessária a internação, liberando-o em
seguida. Reclamando de dores ao voltar para casa, o filho de
Angelo, Anderson Scabio, ligou para o Dr. Jair pedindo
orientações sobre o que poderia ser feito, já que houve a
recusa do pedido de internação. De posse da informação, Dr.
Jair ligou para a recepção do Pronto Socorro e informou a
necessidade da internação, o que novamente não ocorreu.
Raquel declarou a nossa
reportagem que o plantonista Dr. Eduardo Leite chegou a
dizer ao filho do paciente que o médico não era empregado do
Dr. Jair, e não iria internar o paciente, pois ele é quem
seria o responsável pelo atendimento do pai.
Diante do impasse, Raquel
conta que o Dr. Jair, juntamente com Anderson, foram atrás
de José Ramalho Gabrielli Junior, Provedor da Santa Casa,
pois ninguém do Pronto Socorro sabia informar onde ele
estaria e nem como poderiam estabelecer contato com o mesmo.
A tentativa seria para conseguir autorização direta do
Provedor para que o próprio Dr. Jair fizesse a internação do
paciente.
Sem sucesso na localização de
Junior Gabrielli, o paciente retornou para sua residência,
permanecendo ali por mais algumas horas. Com as dores
aumentado, a família voltou ao Pronto Socorro por volta das
23h00 do sábado e desta vez, o plantonista Eduardo Leite
cedeu e acabou solicitando a internação de Angelo.
Após uma noite inteira
reclamando de dores, Angelo piorou na manhã de domingo, e
devido a troca do plantão, até aquele momento, não havia
nenhum médico para atender o paciente. Com a ausência de um
profissional, e com o estado de saúde do paciente se
agravando, a família
entrou em contato novamente com o Dr. Jair, porém, para o
atendimento do paciente, ainda seria necessária a
autorização do Provedor da Santa Casa, que mais uma vez, não
pode ser localizado.
Familiares de
Angelo estavam visivelmente revoltados defronte a
Santa Casa
Raquel relatou também,
que durante o impasse causado pela falta de médico
plantonista e pela não autorização do atendimento
pelo médico da família, ouviu de alguns funcionários
da Santa Casa que isso era normal acontecer por ali,
e que este impasse entre provedoria e médicos
particulares já vem ocorrendo a um bom tempo.
Depois de uma longa
espera, que durou cerca de duas a três horas, Raquel
relatou que chegou no local um plantonista vindo de
Porto Ferreira, inclusive acompanhado de outras
pessoas. Após examinar o paciente, o médico disse
que não havia constatado nada de anormal, e mesmo
diante das reclamações de dor relatadas por Angelo,
ele acabou indo embora.
Ainda segundo o relato da
nora, com as constantes pioras do sogro na tarde de domingo,
o filho Anderson tentou mais uma vez localizar Junior
Gabrielli, para obter a autorização daquele Provedor para
que o Dr. Jair pudesse atender o seu pai. Sem sucesso na
localização do provedor e sem um plantonista no local, Angelo sofreu uma parada cardíaca e faleceu.
Os familiares
de
Angelo relataram também que diante da parada cardíaca e
devido a falta de um médico no local, o enfermeiro Amarildo tomou a
decisão de leva-lo para a sala de emergência, numa
tentativa desesperada de salvar a vida do paciente. Porém,
sem a presença de um profissional, não houve sucesso na
tentativa de uma possível reanimação.
MÉDICO DA
FAMÍLIA
Em contato telefônico com o
Dr. Jair Antonio da Costa no final da tarde de domingo (24),
o médico confirmou o atendimento do paciente na tarde de
sábado. Dr. Jair disse que encaminhou o paciente para a
internação na Santa Casa por volta das 13h30 daquele dia, e
que soube da não internação de Angelo através do filho dele.
Segundo Dr. Jair, não é de
hoje que os médicos que não participam dos plantões da Santa
Casa de Misericórdia de Descalvado enfrentam problemas para
a internação e acompanhamento de seus pacientes,
encaminhados através do SUS. Ainda segundo o médico, existe
uma determinação da provedoria da Santa Casa para que o
acesso e o atendimento aos pacientes por médicos
particulares,
ocorra somente após autorização escrita daquele órgão
administrativo. Dr. Jair afirmou que de acordo com a norma
n.° 25 do Conselho Regional de Medicina - CRM, esse
impedimento imposto aos médicos não poderia estar ocorrendo.
O médico disse ainda que
tentou por diversas vezes dialogar com a administração da
Santa Casa para que este impedimento seja revisto, mas em
nenhuma delas obteve sucesso. Dr. Jair disse também que esta
não é a primeira vez que este tipo de situação acontecesse
com um de seus pacientes: “Se não me engano, essa é a quinta
ou sexta vez que isso ocorre. Isso não pode mais acontecer”
concluiu o médico.
Por fim, Dr. Jair disse que
prevendo que não conseguiria atender o paciente, tentou um
contato com o Diretor Clínico da Santa Casa, Dr. Vander
Rogério Vieira, mas não foi possível localizá-lo. Diante disso, Dr.
Jair redigiu uma carta detalhando o caso e a endereçou ao
Diretor Clínico, entregando o documento na portaria da
entidade por volta das 12h00 do domingo.
INVESTIGAÇÃO
Acionada pelos familiares de Angelo,
nossa equipe de reportagem chegou à Santa Casa por volta das 15h45 do domingo,
porém, também não conseguimos contato com o Provedor e com o Diretor
Clínico da Santa Casa de Misericórdia de Descalvado. Também
não tivemos êxito em falar com a enfermeira chefe que estava
de serviço, que preferiu não se manifestar. A única informação
obtida foi através da recepcionista do Pronto Socorro,
informando-nos a respeito da escala de plantão neste final
de semana. Segundo a atendente, o plantonista que estava
trabalhando no período das 7h00 da manhã do sábado (23) até
as 7h00 da manha do domingo (24) era o Dr. Eduardo Leite.
Após as 7h00 da manhã do dia 24, o plantonista escalado era o Dr.
Celso, que também não foi encontrado por nossa equipe.
O sentimento de
revolta da família da vítima, que pela falta de
plantonista e pela negativa em permitir que o médico da
família atendesse o paciente, gerou muita reclamação
e inconformismo na porta da Santa Casa de
Misericórdia.
Mesmo com a presença
do prefeito Anderson Sposito no local, que também
foi acionado pela família, não foi possível
encontrar ninguém da direção da Santa Casa para
esclarecer as denúncias.
Cabe agora ao prefeito
municipal, que ciente do caso, determine à
Secretaria de Saúde, por intermédio do
Secretário
Carlos Bianchi, para que as denúncias da falta de
médico plantonista e da não autorização da entrada
de médicos particulares para o atendimento de
pacientes na Santa Casa sejam apuradas.
Segundo informações de
pacientes que também estavam no Pronto Socorro na tarde
deste domingo, a falta de médico plantonista tem se tornado
frequente desde o início do ano.
Na edição de número 23 do
Jornal Descalvado News (veja abaixo) já havíamos
apresentado as reclamações da população quanto à demora e a
qualidade do atendimento dos médicos plantonistas do Pronto
Socorro Municipal. Estaremos acompanhando as novas denúncias
resultantes do caso ocorrido na tarde do último domingo e a partir de agora
estaremos cobrando também as responsabilidades sobre a
qualidade da saúde em Descalvado.