Apesar do trabalho que deu para o brasileiro se acostumar com a
nova moeda – muitos usavam calculadoras para transformar a moeda
anterior (cruzeiro real) em real e ter uma referência de quanto
o produto valia –, o plano deixou como herança a possibilidade
de se planejar gastos.
“O brasileiro
aprendeu o verdadeiro valor do dinheiro. Soube quanto ganhava
efetivamente e o real valor dos bens que poderia adquirir.
Conseguimos entender os juros no Brasil e a necessidade de se
ter metas claras de combate à inflação. A capacidade de compra
aumentou, determinada pela estabilidade da economia. E o mais
importante é que durante os anos de estabilidade, todo
brasileiro começou a planejar o futuro, elaborar um planejamento
financeiro de longo prazo”, diz Fabiano Guasti Lima, pesquisador
do Instituto Assaf.
O que dá para comprar com R$ 1?
A hiperinflação
foi extinta na década de 1990, mas os preços continuaram
subindo ao longo dos anos, e o R$ 1, que antes comprava
dez pãezinhos ou até mesmo um quilo de frango, hoje não
paga muito mais que um punhado de balas e chicletes.
É difícil
achar produtos por R$ 1. No hortifruti, é possível
comprar pouca coisa: algumas laranjas, cebolas ou uma
maçã. Na padaria, consegue-se comprar menos de três
pães, com o quilo beirando os R$ 8. Entre os
industrializados, nada muito saudável fica dentro desta
faixa de preço, a não ser sucos em pó, gelatinas e
refrigerantes. Procurando bem, encontra-se um chocolate
ou biscoito em promoção, garrafas de água de 300 ml ou
uma lata de ervilha.
Considerando a inflação acumulada de julho de 1994 até
maio deste ano, de 359,89% pelo Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA), o poder de compra da moeda
brasileira caiu perto de 80%. Assim, R$ 1 de 20 anos
atrás vale agora R$ 0,21, bem como R$ 10 daquela época
foram reduzidos a R$ 2,13. Quando comparada a quantia de
R$ 100 em 1994 e neste ano, a diferença chega a R$
78,70. Os cálculos são do matemático José Dutra de
Oliveira Sobrinho.
Como está a inflação hoje?
Segundo Silber,
professor da USP, o país hoje convive com uma inflação
que não pode ser considerada baixa, mesmo que fique
longe da alta de preços do início dos anos 90.
“A
literatura considera alta [inflação] quando passa de 10%
ao ano. Baixa é de até 3%. O Brasil está no meio do
caminho [cerca de 6%]. Hoje, a inflação neste país é de
arrocho salarial [quando os reajustes de salário não
acompanham a inflação]. Se tirar os preços que o governo
controla, como de ônibus, gasolina e energia, a inflação
seria desconfortável. E o pessoal de mais baixa renda é
o que mais sente, não consegue mais comprar carne todo
dia”, afirma. |
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Preços acima da
média -
Alguns gastos subiram
ainda mais que a inflação desde o início do Plano Real e
preocupam quem se acostumou com a estabilidade. “O brasileiro é
muito mais sensível a um aumento na taxa de inflação. Sem a
adoção do Plano Real, certamente, ela continuaria bastante
descontrolada, nos patamares observados anteriormente ao plano
ou até pior”, diz Alessandra Ribeiro, da Tendências Consultoria.
A cesta básica
vendida na cidade de São Paulo, por exemplo, ficou 443,82% mais
cara, enquanto a inflação acumulada foi de 359,89%. O preço da
cesta era de R$ 67,40 em julho de 1994 e passou para R$ 366,54
em maio deste ano, de acordo com dados do Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Em
julho de 1994, Itamar Franco, à direita, mostra cédulas
do real ao lado de Rubens Ricupero, que substituiu FHC
como ministro da Fazenda
(Foto: Ed Ferreira/Arquivo/AE) |
“O medo
atual da inflação se deve à perda de poder de compra que
sentimos no nosso bolso. Compramos menos coisas que
comprávamos no início do Plano Real. Sem ele [plano],
que lançou as bases de estabilidade da economia, a
situação seria bem crítica. Teríamos inflação bastante
elevada, alto nível de desemprego e crescimento medíocre
do PIB [Produto Interno Bruto]. A Argentina hoje é um
reflexo desse cenário”, diz o pesquisador do Instituto
Assaf.
O reajuste
do salário mínimo ao longo dos anos também fez o
brasileiro sentir como a inflação corroeu seu poder de
compra, que havia sido retomado nos idos de 1994. De R$
64,79, o piso passou para R$ 724. Sem tirar a inflação,
o aumento no valor é animador, mas, quando a taxa é
considerada, o crescimento é bem menor, de 146%,
conforme aponta estudo do Instituto Assaf. |
Aplicações
financeiras -
A inflação
pesou sobre os ganhos de quem tinha aplicações. A rentabilidade
da poupança foi de 1.182,18% de julho de 1994 até março deste
ano. Tirando a inflação, cai para 182,01% de valorização.
No caso do CDB
(Certificado de Depósito Bancário), a rentabilidade acumulada
foi ainda maior, de 2.059,19%. Porém, desconsiderando a
inflação, cai para 374,9%.
Entre todas as
aplicações analisadas pelo estudo do Instituto Assaf, a que
registrou a maior rentabilidade foi o CDI (Certificado de
Depósito Interbancário), de 3.175,14%, mas o crescimento real
foi de apenas 620,35%. A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa)
aparece em terceiro lugar, com uma rentabilidade nominal de
1.284,25% e real de 204,46%.
“O CDI teve a
maior rentabilidade por ter sido mais estável ao longo do tempo.
Pagou taxas mais homogêneas no período, que passou por várias
instabilidades e crises. A bolsa sofreu, não por ela mesmo, mas
pelas diversas crises que assolaram o mundo e que acabamos
sentindo aqui os reflexos”, disse Guasti, pesquisador do
instituto.
*Com informações da 'Seção Economia' do G1
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